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sexta-feira, 30 de setembro de 2011

O CADÁVER


Como pode tão branca derme
não atrair da terra os vermes,
E nem do céu a neve como berne
Deste frio cadáver embalsamado em germe?
Do vinho ao sangue que me lavo,
Da carne a alma em que me salvo,
Sou tão cadáver quanto tu, princesa deste salmo,
Sou tão abstrato quanto o fundo de seu covil…um palmo.
Como pode uma mão tão fria
Ocultar como um vel
Os olhos de um anjo ao cair do céu?
Espero-te no inferno perguntar-me em prosa
O por que parei de me alimentar de tua carne,
Responderei em versos que tua alma é mais saborosa.

Lord Byron.

A Minha Tragédia


 


Tenho ódio à luz e raiva à claridade
Do sol, alegre, quente, na subida.
Parece que a minh'alma é perseguida
Por um carrasco cheio de maldade!

Ó minha vã, inútil mocidade
Trazes-me embriagada, entontecida!...
Duns beijos que me deste, noutra vida,
Trago em meus lábios roxos, a saudade!...

Eu não gosto de sol, eu tenho medo
Que me leiam nos olhos o segredo
De não amar ninguém, de ser assim!

Gosto da Noite imensa, triste, preta,
Como esta estranha e doida borboleta
Que eu sinto sempre a voltejar em mim!...
 


Florbela Espanca

SOLITÁRIO


Como um fantasma que se refugia
Na solidão da natureza morta,
Por trás dos ermos túmulos, um dia,
Eu fui refugiar-me à tua porta!

Fazia frio e o frio que fazia
Não era esse que a carne nos contorta...
Cortava assim como em carniçaria
O aço das facas incisivas corta!

Mas tu não vieste ver minha Desgraça!
E eu saí, como quem tudo repele,
-- Velho caixão a carregar destroços --

Levando apenas na tumba carcaça
O pergaminho singular da pele
E o chocalho fatídico dos ossos!


Augusto dos Anjos